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Histórias de amor


Dizem-nos que há histórias de amor felizes, daquelas que fazem história. De tempos em tempos uma qualquer reportagem na imprensa ou na televisão faz-nos acreditar que sim: casais na idade sénior que, espelhando enorme cumplicidade e ternura, relatam as adversidades que tiveram de enfrentar para ficarem juntos; outros que se desencontraram, viveram outras vidas e acabaram por se reencontrar como se o destino tivesse determinado que teriam de viver o amor prometido mas adiado; outros ainda que ignoram as diferenças que os separam e constroem sonhos para o futuro.
Os mais cépticos dirão que as histórias de amor felizes só existem nos livros e nos filmes. Os mais realistas afirmarão que as histórias de amor têm um início auspicioso mas que tendem a perder o fôlego, esvaziando-se de interesse e de sentimentos. Há também os idealistas, que acreditam que todo o ser há-de encontrar a sua alma gémea e ser feliz. Há depois todos os outros, os que mesmo desencantados com o amor acreditam em histórias felizes, os que constroem a sua história de amor no dia-a-dia assente na partilha e na construção de projectos e sonhos comuns, e os que vivem a verdadeira história de amor não se dando conta de que a estão a viver. Tal sucede porque as histórias de amor felizes – sim, felizes, porque há histórias de amor infelizes – são, afinal, histórias iguais às de gente como nós, gente que chora e que ri, que sofre e que luta, gente que, efectivamente, vive a vida.

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