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Mensagens

A mostrar mensagens de outubro, 2012

Casa vazia

Caminha devagar, sem pressa de chegar ao destino. Não tem ninguém à sua espera, por isso tanto faz mais cedo como mais tarde. Aguarda-o uma casa vazia, onde outrora havia companhia. Hoje, resta apenas ele. As paredes agora despidas exibiam retratos de uma família que deixou de o ser. Uma história igual a tantas outras, que o destino se encarregou de escrever indiferente à vontade dos protagonistas. A agitação de uma cidade que se despede de mais um dia traz-lhe à memória os tempos em que ansiava pelo regresso a casa, para o aconchego do lar, em busca do merecido repouso, onde o aguardavam os mais doces sorrisos e os abraços mais reconfortantes. Caminha devagar, porque não há pressa agora. O destino pregou-lhe a mais injusta e traiçoeira de todas as rasteiras e, de uma só vez, levou-lhe todas as razões que o faziam sorrir.  

Palavras contidas

Mais tarde ou mais cedo há-de falar, desembrulhando as palavras que mantém cárceres da sua cobardia. Não alcançou ainda a patamar que lhe conferirá a segurança e a coragem para falar o que há muito traz abafado no peito. Às vezes é como se estivesse junto ao precipício, pronta a saltar, sem medos. Nessas alturas, chega até a achar ridículo tanto receio de se expor e acha-se capaz dos feitos mais audazes, ainda que em causa esteja só falar, dizer o que sente. São, porém, arrojos momentâneos, que se diluem tão rápido como o sol em dia de chuva. Ensaia incontáveis vezes formas e meios de o dizer, chega até a sentir a leveza espiritual que o desabafo, que não o foi, proporciona, mas é também efémera a sensação. Um dia, diz para si própria. Um dia não mais conseguirá calar as palavras que lhe queimam os lábios e travar o ímpeto de confessar o amor que despertou no seu coração.

Vento

Ouves o vento a soprar, desejoso de invadir cada porta e janela fechadas? Parece que anda perdido, sem norte, à procura de um lugar para se abrigar. Corre como louco, não se percebe para onde quer ir. Ora rebola pelo chão, atirando pelo ar as folhas amarelecidas de um Outono ainda a fazer-se anunciar, ora se eleva ao mais alto dos arranha-céus, desafiando a mais resistente das edificações. Brinca com os cabelos como a fazer pirraça, atrevido levanta saias e vestidos, assobiando a cada esquina. Provoca, desafia. Gosto do vento, sabes? Às vezes esmorece, mas, num abrir e fechar de olhos, revela toda a sua força. Impõe-se, faz-se respeitar. Acho que nesses dias também quer sacudir os corpos e as mentes amorfas.

De alma aberta

Reescreve o guião de uma história a que assistiu na vida real e na tela. Das promessas de amor eterno, da dedicação extrema à rotina que se instala, até à quase indiferença. Conhece de cor o final do filme, onde ela própria foi personagem. Julgava o seu coração adormecido, mas sentiu-o despertar qual flor a desabrochar sob o sol da Primavera. Ei-la de novo de alma aberta, numa alegria adolescente, pronta a desfrutar de fortes e intensas emoções. Com os pés no chão e a cabeça nas nuvens, ela entrega-se na esperança de um happy end.   

Despertar

Ouço vozes ao longe. Vêm em ondas, tornando-se cada vez mais claras ao ritmo do meu lento acordar. Dás-me a tua mão e eu agarro-a qual bóia de salvação, como se dela dependesse a minha sobrevivência. Dizes o meu nome baixinho, num sussurro soprado ao meu ouvido. Respondo com um sorriso. Desafias-me a ir ver o mar e arrastas-me até à varanda. Sumiram-se as vozes e nada mais se ouve que o barulho das ondas, num suave ondular, qual música que nos embala. Ignoramos deliberadamente o relógio, obrigando-o a dar-nos o tempo que nos tem faltado.

Problema de expressão

Gostaria de saber exprimir por palavras o que o meu coração sente, mas este problema de expressão que marca o meu ADN não mo permite. Ficam mudas as palavras na minha boca e olho-te na esperança de que saibas mais de mim do que julgo saber. Fico na expectativa de que possas adivinhar o que estou a pensar quando me sinto demasiado exposta a teus olhos. Acaso terás a capacidade de perceber que quero que fiques quando digo que está na hora de ires embora? E que é somente por medo de sofrer alguma desilusão que te dou a entender que não quero compromissos? Não te dás conta de que não é o frio que me arrepia a pele, mas o teu toque que desperta em mim sensações que me fazem perder o discernimento? Ou porque rio quando queres falar sério, boicotando qualquer conversa que me leve a dizer mais do que me sinto capaz? Será somente um problema de expressão? Ou será que tarde me dei conta de que já não sou dona da minha vontade?