Quisera, outrora, ter o tempo que agora lhe sobra. Quisera, nesses dias tão cheios, encontrar tempo para o que não lhe chegavam as horas do dia. Quisera parar o tempo para que o tempo não a arrastasse nesse compasso frenético. Quisera que os dias fossem dias mais tempo para ter tempo. Quisera ter tempo quando o tempo não lhe chegava.
Ironicamente, hoje tem tempo, todo o tempo… Tem tempo para olhar para trás e perceber que o tempo passou sem lhe dar tempo para ter tempo! Tem tempo para olhar em frente e constatar que tem todo o tempo para fazer coisa nenhuma! Maldito tempo em que faltava tempo! Amaldiçoado tempo que sobra agora!
Olha-se ao espelho e lá estão as marcas do tempo, expondo, sem pudor, os anos vividos, marcas vincadas de um tempo que foi sempre pouco quando tudo o mais era demasiado. Queria, agora, poder voltar atrás para arranjar tempo para tudo quanto ficou por viver...
O toque do sino, anunciando as horas, fez-se ouvir, quebrando o silêncio e trazendo-o de volta à realidade. Não dera pelo tempo passar, absorto e perdido em pensamentos, arrastado para as memórias com que ia esbarrando a cada divisão da casa, que ia percorrendo com vagar. Como não lembrar daquela casa cheia de vida, repleta de gente, numa permanente azáfama, típica das famílias numerosas. De repente, era de novo um menino, perdido em tropelias com os irmãos, qual deles o mais travesso. A voz da mãe a chamar para a mesa, o cheirinho da comida de conforto, memórias tão vívidas que um arrepio lhe percorreu a espinha. Tateou a mesa da sala, onde tantas vezes partilharam refeições, risos e alegrias. A sala de jantar testemunha dos momentos mais felizes, mas também dos mais tristes, como as despedidas dos avós e, mais tarde, dos pais. Piscou os olhos, na ânsia de afastar as lágrimas que ameaçavam brotar. Invadiu-o a nostalgia, sentindo ecoar, num lamento, a canção de Pedro Abrunhosa… “quer
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